quarta-feira, 13 de maio de 2020

Os rabiscos de Leonardo DaVinci

A princípio, contaria para você neste post um pouco sobre uma exposição dos inventos e obras de Leonardo DaVinci que fui no começo do ano. Mas ao revisar as fotos que tirei durante o passeio, percebi que as réplicas de seus inventos em tamanho real e exibição de seus quadros em tamanhos colossais não chamaram tanto a minha atenção quanto os esboços feitos pelo artista em seu pequeno caderninho, modestamente colocado numa redoma de vidro.

Caderninho de estudos de Leonardo DaVinci.

Somos culturalmente influenciados, desde crianças, a colocar Leonardo num pedestal, e associar sua Mona Lisa como "obra prima" mesmo não sabendo o que de fato significa essa expressão ou quais foram suas contribuições no cenário artístico do Renascimento. Quando vi de perto seu caderno de esboços, há poucos centímetros de mim (separado por uma grossa lâmina de vidro, é claro), pude trazer de volta DaVinci para o mundo dos mortais, e percebê-lo como "gente como a gente".

Partiu Renascimento!
Antes de continuarmos, proponho uma viagem no tempo para a Itália do século XV. Vamos?
Até então, as pessoas com habilidades manuais - escultores, arquitetos, vidraceiros - eram contratadas pela Igreja Católica para produção de artigos religiosos: murais, esculturas, ornamentos, objetos sacros etc. Pois é, antes não se apreciava arte, pois os painéis religiosos serviam para educar os fiéis sobre os castigos divinos.

Mais ou menos nesta época a Igreja foi perdendo a sua soberania, mas foi ainda durante muito tempo uma instituição muito influente na vida das pessoas e "ditava moda" por assim dizer. Daí, famílias ricas começaram a contratar artesãos para encomendar peças de arte para seus casarões. Foi quando se deu origem ao mecenato, à profissão "artista", e à ideia de arte como algo para ser apreciado. Agora patrocinados, os artistas puderam melhorar suas técnicas e entregar trabalhos cada vez mais "belos". (Sabe a plataforma Patreon? Então, mesma coisa, mas sem internet)

Durante o Renascimento, as ciências naturais e humanas voltaram a ser estudadas, e socialmente o padrão de beleza adotado se inspirava em cânones da antiguidade clássica. Neste momento é que encontraremos os grandes nomes da pintura e escultura italianos, e entenderemos o porquê de Leonardo DaVinci ser gente como a gente.

Como se formava um artista renascentista?
Ainda não existem escolas de arte por aqui... Os jovens que pretendem virar artistas precisam aprender o ofício com outros artistas mais experientes. Leonardo, inclusive, trabalhou muitos anos com Andrea del Verrocchio para aprimorar suas habilidades até ser financiado por mecenas. Os aprendizes ajudavam seus mestres com as encomendas e estudavam suas obras para aprender técnica.

Andrea del Verrocchio - Dama com buquê, 1475 // Leonardo DaVinci - Ginevra de'Benci, 1975-76
Uma espécie de "desenhe isso no seu estilo" do período Renascentista.

Na casa dos 30 anos, já morando em Milão e trabalhando para família Sforza, Leonardo começou a ampliar seus estudos sobre perspectiva e natureza, desenvolvendo seus próprios métodos de representação pictórica - sendo o mais notável deles o esfumato. Muito desses seus estudos estão documentados em seus caderninhos de esboço, que até nos dias de hoje nos causa tanta admiração.

Voltemos para 2020!
O que nos aproxima de Leonardo DaVinci é o fato de termos conosco um caderno de rascunhos, onde fazemos nossas anotações, nossos estudos, os rabiscos, onde documentamos nosso processo de aprendizagem das artes, do design, da ilustração. Esse é o nosso ponto em comum! Assim como DaVinci contribuiu para as artes nos tempos dele, e outros grandes nomes assim fizeram a cada período, também temos potencial para produzir conhecimento de modo a aperfeiçoar cada vez mais o que fazemos.

Páginas com estudos (desenhos e anotações) de Leonardo DaVinci sobre anatomia humana.

Leonardo DaVinci - Virgem com o Menino Jesus (Virgem Benois), 1478-80.
Dos esboços até a pintura.

O importante é começar! Estude, rabisque, faça do seu sketchbook seu melhor amigo. Não importa se o desenho ficar inacabado, ou se não vai servir para algo imediato... guarde a ideia, mais tarde ao consultá-la poderá fazer mais sentido. Use para treinamento das suas habilidades, desenvolvimento das suas técnicas. Em se tratando de arte, já não temos amarras formais! Somos livres para criar o que quisermos. Tudo é possível e há uma infinidade de materiais, técnicas e estilos para serem explorados.

Bons estudos! Até a próxima! o/

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Este post foi inspirado na visita à exposição Leonardo DaVinci - 500 anos de um gênio - Museu da Imagem e do Som, em São Paulo; e na edição Grande Mestres - Leonardo DaVinci, da Abril Coleções; São Paulo: Abril, 2011.


4 comentários:

  1. Que postagem maravilhosa! Cada dia valorizo mais o meu sketchbook com vários rabisco e me desprendo mais da ideia de que eles precisem ser acabados.
    Somos todos Leonardo!

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    1. Obrigada, Débora!!! Perdi a conta das vezes que deixei de usar um sketchbook por estar sem ideia para um desenho "bom". Eu via imagens de cadernos de outros artistas com desenhos lindamente acabados, e me sentia mal por não conseguir ser tão bom quanto. Acho que os próprios ilustradores foram, ao longo do tempo, desconstruindo a ideia de que sketchbook como portfólio. Uma coisa é uma coisa, e a outra é outra.

      Vamos ser livres para rabiscar! Dando certo ou errado, o importante é documentar as nossas experiências!!! # Somos todos DaVinci! rs

      Bjos

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  2. Rapaz, que aula!!!
    Se até os deuses como Leonardo tinham sketchbook, pq nós meros mortais não teríamos?
    Ele é tão bom para o nosso crescimento. E acredito que ele é mais que um caderno de esboço. Ele registra momentos e sentimentos através do desenho. Sim, são mais que rabiscos.
    Ótimo post, Nane

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    1. Ei, Silvia!!!
      Verdade... podemos revisitar sentimentos e pensamentos ao olhar para os esboços no caderno. É uma sensação bem única!
      Obrigada pelo seu comentário.

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